O meu sexto artigo na revista Atlântico (Jun 06)
HOLA MADRID
Zapatero sem roteiro para a paz
Nuno Garoupa
Zapatero enfrenta neste momento talvez o desafio político mais arriscado do seu Governo. As reivindicações oportunistas das várias comunidades autónomas que decidem subir-se ao carro das reformas dos seus estatutos, todas patrocinadas por essa coligação de socialistas, comunistas e nacionalistas que governa em Espanha, após o êxito do Estatut da Catalunha (veremos até quando os PP valenciano e balear conseguem resistir à tentação de subir a esse mesmo carro). O abandono por parte do PP da frente anti-terrorista e do processo de paz e negociação com a ETA deixando o Governo sem o respaldo de quase metade da sociedade espanhola. As eleições antecipadas na Catalunha que dificilmente produzirão um governo estável e que vão hipotecar a flexibilidade de Zapatero para negociar com a CiU (centro-direita nacionalista da Catalunha) uma solução governativa independente da ERC (independentistas da Catalunha).
Depois de ter activamente criado um cordão sanitário em redor do PP com a sua coligação de sete ou oito partidos “Todos Contra o PP” que lhe permitiu ganhar as eleições em 2004 e lhe tem permitido governar com sossego, Zapatero pretendeu desde o cessar-fogo da ETA acercar-se ao PP para minimizar o desgaste eleitoral que as concessões que tem que fazer vai acarretar. Sem dúvida que a paz terá rentabilidade eleitoral a médio prazo, mas as concessões a fazer dificilmente serão consensuais na sociedade espanhola no curto prazo. Um processo de paz negociado entre o Governo e a ETA sem apoio do PP, para além de ser um enorme risco político para Zapatero, vai ser fracturante e verdadeiramente dramático para os espanhóis. Na verdade, as consequências da irresponsabilidade e oportunismo político do PSE são ainda difíceis de prever (o PP decidiu romper com o Governo socialista no principio de Junho após ser conhecida publicamente uma reunião do líder do PSE, socialistas do País Basco, com os lideres do Batasuna, organização ilegalizada pela sua associação a actividades terroristas tal como consta das sentenças do poder judicial).
Tudo indica que Zapatero perdeu o controle sobre os seus barões regionais. Na Catalunha, não vale a pena falar. A confusão é generalizada, o governo tripartido acabou sem glória e sem história, é o salve-se quem puder (aliás apenas os comunistas da IC saem relativamente bem mas sem grande possibilidade de rentabilizar eleitoralmente essa mais-valia dada a sua reduzida dimensão eleitoral). Na Andaluzia e na Galiza, propõem-se reformas dos respectivos estatutos de autonomia que seguem o modelo catalão e que levantam sérias dúvidas sobre quem vai pagar tudo isto (continua a ser uma incógnita como vai reagir a comunidade de Madrid onde tudo indica que o PSOE já dá como perdida nas eleições regionais na Primavera de 2007). Mas é no País Basco que Zapatero tem mais dores de cabeça. O socialistas bascos namoram o Batasuna de forma a retirar ao actual Governo basco do PNV qualquer papel activo e focal no processo de paz. Não é mesmo de descartar um governo PSE/Batasuna para o País Basco para um futuro próximo.
O calendário eleitoral é complicado. As próximas eleições gerais devem ter lugar no Inverno de 2008 se a legislatura chegar ao fim, a maioria absoluta é o objectivo. Uma antecipação só tem sentido para o Inverno de 2007 dadas as eleições antecipadas na Catalunha no Outono de 2006 e as eleições regionais em quase toda a Espanha na Primavera de 2007. E o processo de paz é ainda mais complicado. Porque precisamente iniciou um processo de negociação da paz com a ETA antes de derrota-la, Zapatero vê-se forçado a por em cima da mesa várias questões preliminares que terão um elevado custo político e social.
Vai ser preciso legalizar o Batasuna, o braço político dos terroristas. Porém os negociadores escolhidos e anunciados pela ETA são directamente responsáveis de crimes hediondos, e não apenas instigadores (a Telemadrid emitiu recentemente um interessante programa sobre a história da ETA onde recordava que vários dos dirigentes do Batasuna estiveram condenados por activamente participar em atentados que resultaram no falecimento de bebés e crianças nos anos 80). Depois Zapatero terá de fazer concessões no tema dos etarras presos fora do País Basco. E aí dificilmente pode Zapatero evitar um conflito grave com o poder judicial (mesmo que faça alterações importantes à legislação penal) como aliás já foi visível nas últimas sentenças judiciais. É ainda preciso saber o que fazer com as vítimas porque não basta acusar a AVT (a associação de vítimas do terrorismo) de estar manipulada pelo PP. Ou anunciar em pleno comício partidário que vai por no preâmbulo da Constituição uma referência às vítimas. Evidentemente que para além destas questões preliminares, Zapatero tem ainda de considerar que solução institucional para o País Basco e para Navarra vai propor.
Faz algum sentido começar a pensar que Zapatero entrou no processo de paz sem roteiro e de forma precipitada, excessivamente pressionado pela complicada situação na Catalunha. Poder-se-ia pensar que é a receita ideal para o desastre. Mas Zapatero já nos habitou a que existe sempre uma saída para o desastre, mesmo que seja outro desastre.
Zapatero sem roteiro para a paz
Nuno Garoupa
Zapatero enfrenta neste momento talvez o desafio político mais arriscado do seu Governo. As reivindicações oportunistas das várias comunidades autónomas que decidem subir-se ao carro das reformas dos seus estatutos, todas patrocinadas por essa coligação de socialistas, comunistas e nacionalistas que governa em Espanha, após o êxito do Estatut da Catalunha (veremos até quando os PP valenciano e balear conseguem resistir à tentação de subir a esse mesmo carro). O abandono por parte do PP da frente anti-terrorista e do processo de paz e negociação com a ETA deixando o Governo sem o respaldo de quase metade da sociedade espanhola. As eleições antecipadas na Catalunha que dificilmente produzirão um governo estável e que vão hipotecar a flexibilidade de Zapatero para negociar com a CiU (centro-direita nacionalista da Catalunha) uma solução governativa independente da ERC (independentistas da Catalunha).
Depois de ter activamente criado um cordão sanitário em redor do PP com a sua coligação de sete ou oito partidos “Todos Contra o PP” que lhe permitiu ganhar as eleições em 2004 e lhe tem permitido governar com sossego, Zapatero pretendeu desde o cessar-fogo da ETA acercar-se ao PP para minimizar o desgaste eleitoral que as concessões que tem que fazer vai acarretar. Sem dúvida que a paz terá rentabilidade eleitoral a médio prazo, mas as concessões a fazer dificilmente serão consensuais na sociedade espanhola no curto prazo. Um processo de paz negociado entre o Governo e a ETA sem apoio do PP, para além de ser um enorme risco político para Zapatero, vai ser fracturante e verdadeiramente dramático para os espanhóis. Na verdade, as consequências da irresponsabilidade e oportunismo político do PSE são ainda difíceis de prever (o PP decidiu romper com o Governo socialista no principio de Junho após ser conhecida publicamente uma reunião do líder do PSE, socialistas do País Basco, com os lideres do Batasuna, organização ilegalizada pela sua associação a actividades terroristas tal como consta das sentenças do poder judicial).
Tudo indica que Zapatero perdeu o controle sobre os seus barões regionais. Na Catalunha, não vale a pena falar. A confusão é generalizada, o governo tripartido acabou sem glória e sem história, é o salve-se quem puder (aliás apenas os comunistas da IC saem relativamente bem mas sem grande possibilidade de rentabilizar eleitoralmente essa mais-valia dada a sua reduzida dimensão eleitoral). Na Andaluzia e na Galiza, propõem-se reformas dos respectivos estatutos de autonomia que seguem o modelo catalão e que levantam sérias dúvidas sobre quem vai pagar tudo isto (continua a ser uma incógnita como vai reagir a comunidade de Madrid onde tudo indica que o PSOE já dá como perdida nas eleições regionais na Primavera de 2007). Mas é no País Basco que Zapatero tem mais dores de cabeça. O socialistas bascos namoram o Batasuna de forma a retirar ao actual Governo basco do PNV qualquer papel activo e focal no processo de paz. Não é mesmo de descartar um governo PSE/Batasuna para o País Basco para um futuro próximo.
O calendário eleitoral é complicado. As próximas eleições gerais devem ter lugar no Inverno de 2008 se a legislatura chegar ao fim, a maioria absoluta é o objectivo. Uma antecipação só tem sentido para o Inverno de 2007 dadas as eleições antecipadas na Catalunha no Outono de 2006 e as eleições regionais em quase toda a Espanha na Primavera de 2007. E o processo de paz é ainda mais complicado. Porque precisamente iniciou um processo de negociação da paz com a ETA antes de derrota-la, Zapatero vê-se forçado a por em cima da mesa várias questões preliminares que terão um elevado custo político e social.
Vai ser preciso legalizar o Batasuna, o braço político dos terroristas. Porém os negociadores escolhidos e anunciados pela ETA são directamente responsáveis de crimes hediondos, e não apenas instigadores (a Telemadrid emitiu recentemente um interessante programa sobre a história da ETA onde recordava que vários dos dirigentes do Batasuna estiveram condenados por activamente participar em atentados que resultaram no falecimento de bebés e crianças nos anos 80). Depois Zapatero terá de fazer concessões no tema dos etarras presos fora do País Basco. E aí dificilmente pode Zapatero evitar um conflito grave com o poder judicial (mesmo que faça alterações importantes à legislação penal) como aliás já foi visível nas últimas sentenças judiciais. É ainda preciso saber o que fazer com as vítimas porque não basta acusar a AVT (a associação de vítimas do terrorismo) de estar manipulada pelo PP. Ou anunciar em pleno comício partidário que vai por no preâmbulo da Constituição uma referência às vítimas. Evidentemente que para além destas questões preliminares, Zapatero tem ainda de considerar que solução institucional para o País Basco e para Navarra vai propor.
Faz algum sentido começar a pensar que Zapatero entrou no processo de paz sem roteiro e de forma precipitada, excessivamente pressionado pela complicada situação na Catalunha. Poder-se-ia pensar que é a receita ideal para o desastre. Mas Zapatero já nos habitou a que existe sempre uma saída para o desastre, mesmo que seja outro desastre.
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