O meu último artigo na Revista Atlântico (Ago 07)
Hola Madrid
Espanha na Encruzilhada
Nuno Garoupa
Dois acontecimentos recentes, as eleições municipais e regionais de 27 de Maio e a declaração unilateral de 6 de Junho da organização terrorista ETA (curiosamente alguma comunicação social portuguesa bem pensante insiste em chamar-lhe organização separatista) de voltar aos atentados e assassinatos, deixaram a Espanha numa difícil encruzilhada.
Ambos acontecimentos são importantes derrotas políticas de Zapatero sem serem vitórias de Rajoy (para mais quando a sombra de Rodrigo Rato volta a pairar). Espanha vive pois uma legislatura esgotada uma vez que o governo apostou no processo de paz e na reforma das políticas territoriais em detrimento da economia (que goza de excelente saúde) sem contudo existir uma alternativa credível fortalecida. A declaração da ETA bem como a informação vinda a pública do rearmamento dos terroristas durante as negociações é, não só um embaraço para o governo, como põe efectivamente fim ao projecto político de Zapatero dos últimos três anos (uma vez que os contactos entre governo e ETA continuaram mesmo depois do atentado do T4 de Barajas em Dezembro último, é mesmo possível que tenham existido até à véspera das eleições regionais). Contudo a resposta pontual do governo não abre nenhuma perspectiva de médio prazo. Para além da propaganda do grupo Prisa (El País e Cadena Ser) para minimizar danos colaterais, essencialmente tudo se limitou ao Ministro do Interior e ao Fiscal-General del Estado alterarem significativamente o seu comportamento em relação ao caso De Juana Chaos (que regressou à prisão poucos dias depois da declaração da ETA) bem como na acusação penal contra Arnaldo Otegi (líder do ilegalizado Batasuna) pelas suas declarações de elogio ao terrorismo.
Zapatero está sem estratégia e sem políticas. Rajoy também. Esta difícil encruzilhada reflectiu-se já nas eleições municipais e regionais. A principal conclusão dessas eleições, enquanto primeira volta das eleições gerais para as Cortes que terão lugar o mais tardar em Março de 2008 (Zapatero já recusou a convocação de eleições antecipadas para o Outono como exigido pelo PP após a declaração da ETA), é que os dois grande partidos deverão ter uma representação parlamentar muito semelhante e equilibrada (os estudos com base nos resultados do 27M apontam para o PP com mais um deputado que o PSOE num universo de 350 deputados).
Essencialmente muito pouco se alterou eleitoralmente a 27M. Os socialistas reforçaram as maiorias nos seus feudos, Extremadura, Castilla-la-Mancha, Astúrias e Aragão mas recuaram inesperadamente em Barcelona. Os populares reforçaram as suas maiorias no seus bastiões, Comunidade Valenciana, Murcia, Castilla-y-León, La Rioja bem como na Comunidade de Madrid (onde os socialistas sofreram um revés histórico não só na comunidade como na cidade de Madrid, mas também nos municípios tradicionalmente socialistas do cinturão sul da cidade de Madrid). Na Cantábria, o PSOE passou a terceiro partido ultrapassado pelo Partido Regionalista de Cantábria que seguirá sendo governo com o apoio do PSOE uma vez que o PP não chegou à maioria absoluta. Nas Baleares, o PP perdeu a maioria absoluta mas o PSOE governará com uma instável coligação de múltiplos partidos (solução já experimentada entre 1999 e 2003). Nas Canárias, o excelente resultado do PSOE contudo não chegou para superar a coligação pós-eleitoral entre a Coligação Canária e o PP. Finalmente, em Navarra, a coligação dos populares (UPN e CDN) perdeu a maioria absoluta e o PSOE passou a terceiro partido tendo a coligação nacionalista (Nafarroa Bai) obtido um excelente resultado (para o governo foral e para o município da capital, Pamplona). Difíceis negociações não levaram a um complicado tripartido entre socialistas, comunistas e nacionalistas.
Temos pois uma situação política muito complicada numa economia que faz inveja aos portugueses. Um empate eleitoral entre o PSOE e o PP deixará o governo qualquer que ele seja dependente dos nacionalistas, à direita (CiU catalã, PNV basco, Coligação Canária) e à esquerda (ERC catalã, BNG galego, EA basco, Nafarroa Bai navarro). Evidentemente que o PSOE parte com vantagem já que o PP terá muita dificuldade em conseguir uma coligação estável com as direitas nacionalistas (se bem que os sinais quer da CIU que obteve bons resultados em Barcelona quer da nova liderança do PNV são positivos para os populares). Mas o problema é que foi precisamente este equilíbrio que conduziu à actual situação que está esgotada.
Para sair da encruzilhada em que a Espanha está a solução política é um governo de grande coligação entre o PP e o PSOE que regresse ao Pacto Antiterrorista de 2001 e ponha em marcha as reformas constitucionais e eleitorais adequadas. Zapatero e Aznar/Rajoy são os principais obstáculos a esta solução. Esperemos que as eleições de 2008 possam afastar as duas lideranças actuais e estabelecer o sentido comum que ponha a política espanhola no bom caminho.
P.S. Por razões profissionais que me levam a outro continente, esta é a última correspondência de guerra desde Madrid. A colaboração com a revista não acaba aqui contudo. Ficou já prometido um artigo de análise aquando das eleições gerais em Espanha.
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